O dia em que Caetano escreveu uma música para esfregar a Bahia na cara do mundo 251b10

Composta em Roma após ver areia do Saara sobre carros europeus, canção é manifesto em defesa da Bahia e do Brasil profundo 3l3h3x

Caetano Veloso compôs Reconvexo em 1989, durante uma temporada em Roma. A inspiração surgiu de uma imagem poética e, ao mesmo tempo, concreta: ao acordar certa manhã, o cantor se deparou com automóveis cobertos por uma fina camada de areia. Intrigado, perguntou o que havia acontecido — e soube que aquilo vinha do Saara. Ventos haviam atravessado o mar e trazido poeira do deserto africano até o coração da Europa.

(Vídeo: Reprodução)

Naquele instante, Caetano começou a compor. A frase “Sou a chuva que lança a areia do Saara sobre os automóveis de Roma” abre a música como um aviso de presença — uma metáfora da força invisível e incontornável que atravessa fronteiras e se impõe, mesmo sem pedir licença. O cantor baiano transformou aquela paisagem improvável em um grito de identidade e resistência. Estava respondendo a um velho incômodo.

Um manifesto contra o preconceito 4032m

Reconvexo nasceu como uma resposta direta às críticas do jornalista carioca Paulo Francis, que morava em Nova York e costumava menosprezar a cultura brasileira, especialmente a nordestina. Caetano, que nunca se esquivou de confrontos intelectuais, escreveu a canção como quem risca o chão com o pé e diz: “Aqui é meu território”.

Mas a resposta veio com arte. Ao longo da letra, ele convoca símbolos, ritmos e pessoas que formam o DNA da Bahia e da cultura popular brasileira. “Quem não rezou a novena de Dona Canô” — sua mãe, figura central em sua formação. “Quem não seguiu o Olodum balançando o pelo” — referência ao bloco afro que redefiniu a música baiana e influenciou o mundo.

Ele ainda cita o swing de Henri Salvador, cantor francês de origem guianense, como ponte entre Brasil e mundo, e contrapõe seu “sonho de seca careta” à riqueza sensorial e espiritual de sua terra.

Reconvexo: palavra e conceito 1c4s3d

O título Reconvexo é uma invenção. Um jogo de palavras que contrapõe o “convexo” do mundo ocidental urbano e moderno ao “reconvexo” do recôncavo baiano — região onde nasceu e de onde brota um Brasil ancestral, negro, plural, musical.

A música, gravada por Maria Bethânia no disco Maricotinha Ao Vivo, se tornou um hino à resistência cultural. “Seu olho me olha, mas não me pode alcançar” sintetiza o recado: não importa quanto tentem analisar, julgar ou rotular a cultura nordestina — ela escapa, transborda e afirma sua força.

Reconvexo não é apenas uma canção. É uma afirmação de pertencimento, um manifesto lírico contra o preconceito e uma prova de que, como a areia do Saara sobre os carros de Roma, há coisas que nenhum vento consegue apagar.

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